sexta-feira, 27 de março de 2015

biografia XL - escuro



daqui não vejo o 
rio que habita
minha infância nem

ouço o mar onde 
se alastram as
águas

onde estou não 
passam as estradas perdidas
de meu pai nem

as saudades
mudas da
mãe

não encontro a molecada
na rua jogando
futebol nem

o limoeiro no
quintal

não reconheço as
árvores nem os
velhos na varanda do

alto da montanha
verde



Adair Carvalhais Júnior

domingo, 14 de dezembro de 2014

biografia XXXIX- viagem



 os dias se alongam
frágeis os ossos
cedem ao peso
da memória

perdeu se a estrada
que trazia o carro carregado
de brinquedos

onde meu pai se refazia
todos os dias

os pés se arrastam
na opacidade do
corpo as horas
se espessam

perdeu se o cheiro
branco do limoeiro
que se espalhava

pelos quintais da infância

meu pai descansa
na poltrona da
sala os olhos
extenuados

na janela o rio
largo corre entre minhas
mãos a sombra

do que não

termina


Adair Carvalhais Júnior

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

biografia XXXVIII - herança



corre um rio escasso
em meus olhos
abatidos

um rio se esvai
nas minhas manhãs doloridas

corre um
rio numeroso no meu
corpo opaco
               
um rio se adensa
nas minhas memórias frágeis

corre um rio
profundo na vasta
casa de meus
filhos

a matéria lodosa das águas se
infiltrou em
mim e me preenche
lentamente


Adair Carvalhais Júnior

domingo, 16 de fevereiro de 2014

biografia XXXVII- encontro

                          

                corre ao norte o rio
                que me sustenta ao
                sul as águas
                geladas que me
                demandam

                os rios que me habitam
                transbordam as chuvas excedem
                as margens carregam

                pedras barro árvores
                desterradas

                estreitados entre os vales vigiados
                de araucárias lavam
                as terras altas fecundam
                as montanhas

                diversos os rios em mim
                se perfazem e mesmo tão
                distantes toco suas inumeráveis
                bordas quando


                me recolho


Adair Carvalhais Júnior

terça-feira, 5 de março de 2013

biografia XXXVI -mantiqueira





                   por onde corre o
                   rio revive a fertilidade
                   da terra que
                   assoma

                   descem suas águas
                   pelas frestas da mata e se
                   ocultam
                   nos distantes

                   abrem se nos vastos
                   espaços e se esfriam
                   na calma dos
                   dias

                   por onde passa o rio
                   oferece a vida
                   murmurante
                   das águas
                                      

Adair Carvalhais Jr

quinta-feira, 7 de junho de 2012

biografia XXXV – júlia

como atravesso a aridez
dos dias insulares das
horas
pantanosas

solo dos meus passos
insensatos

e construo meus poemas
imprevistos

como acolhe meus
rios nas margens me
conforta num corpo
imenso

como me salva
diariamente da morte
insone que me arrasta

nas encostas do
desespero

sonhos das minhas brumas
insalubres

Adair Carvalhais Júnior

quinta-feira, 19 de abril de 2012

biografia XXXIV – cidades

I.

na curva dos dias o rio
estendeu suas margens forjou
devagar seu leito
de areia e sombras

moveu encostas carregou
pedras contornou
a montanha sem jamais
afrontá la

solos arruinados enseadas
aterradas sobre
as pontes a brutalidade
dos homens

e o rio das minhas lembranças
engoliu a cidade
e suas imundícies
num dia de chuva



II.


sob as janelas
sinuosas rios e córregos penetram
na noite

casas pequenas espiam
as margens abrigos
mornos nas perdidas
distâncias

homens e mulheres aninham se
na sombra perene
da montanha
mineral

que se estende inteira
no horizonte


III.


rasgadas na poeira ruas
e avenidas sufocam
rios e córregos

casas trepam nos morros
vales se entopem de
lixo esquinas
abandonadas

a montanha exportada
em pedaços um horizonte
inteiro desfigurado


furiosa a chuva continua
engolindo a cidade


Adair Carvalhais Júnior